segunda-feira, 4 de julho de 2011

Como elaborar uma resenha

1. Definições

Resenha-resumo:
     É um texto que se limita a resumir o conteúdo de um livro, de um capítulo, de um filme, de uma peça de teatro ou de um espetáculo, sem qualquer crítica ou julgamento de valor. Trata-se de um texto informativo, pois o objetivo principal é informar o leitor.

Resenha-crítica:
     É um texto que, além de resumir o objeto, faz uma avaliação sobre ele, uma crítica, apontando os aspectos positivos e negativos. Trata-se, portanto, de um texto de informação e de opinião, também denominado de recensão crítica.



2. Quem é o resenhista

      A resenha, por ser em geral um resumo crítico, exige que o resenhista seja alguém com conhecimentos na área, uma vez que avalia a obra, julgando-a criticamente.



3. Objetivo da resenha

      O objetivo da resenha é divulgar objetos de consumo cultural - livros,filmes peças de teatro, etc. Por isso a resenha é um texto de caráter efêmero, pois "envelhece" rapidamente, muito mais que outros textos de natureza opinativa.



4. Veiculação da resenha

       A resenha é, em geral, veiculada por jornais e revistas.



5. Extensão da resenha

      A extensão do texto-resenha depende do espaço que o veículo reserva para esse tipo de texto. Observe-se que, em geral, não se trata de um texto longo, "um resumão" como normalmente feito nos cursos superiores ... Para melhor compreender este item, basta ler resenhas veiculadas por boas revistas.



6. O que deve constar numa resenha

Devem constar:
  • O título
  • A referência bibliográfica da obra
  • Alguns dados bibliográficos do autor da obra resenhada
  • O resumo, ou síntese do conteúdo
  • A avaliação crítica


7. O título da resenha

     O texto-resenha, como todo texto, tem título, e pode ter subtítulo, conforme os exemplos, a seguir:

Título da resenha: Astro e vilão
Subtítulo: Perfil com toda a loucura de Michael Jackson
Livro: Michael Jackson: uma Bibliografia não Autorizada (Christopher Andersen) - Veja, 4 de outubro, 1995

Título da resenha: Com os olhos abertos
Livro: Ensaio sobre a Cegueira (José Saramago) - Veja, 25 de outubro, 1995

Título da resenha: Estadista de mitra
Livro: João Paulo II - Bibliografia (Tad Szulc) - Veja, 13 de março, 1996


8. A referência bibliográfica do objeto resenhado

      Constam da referência bibliográfica:

  • Nome do autor
  • Título da obra
  • Nome da editora
  • Data da publicação
  • Lugar da publicação
  • Número de páginas
  • Preço
Obs.: Às vezes não consta o lugar da publicação, o número de páginas e/ou o preço.

       Os dados da referência bibliográfica podem constar destacados do texto, num "box" ou caixa.

       Exemplo: Ensaio sobre a cegueira, o novo livro do escritor português José Saramago (Companhia das Letras; 310 páginas; 20 reais), é um romance metafórico (...) (Veja, 25 de outubro, 1995).



9. O resumo do objeto resenhado

     O resumo que consta numa resenha apresenta os pontos essenciais do texto e seu plano geral.

     Pode-se resumir agrupando num ou vários blocos os fatos ou idéias do objeto resenhado.

     Veja exemplo do resumo feito de "Língua e liberdade: uma nova concepção da língua materna e seu ensino" (Celso Luft), na resenha intitulada "Um gramático contra a gramática", escrita por Gilberto Scarton.




"Nos 6 pequenos capítulos que integram a obra, o gramático bate, intencionalmente, sempre na mesma tecla - uma variação sobre o mesmo tema: a maneira tradicional e errada de ensinar a língua materna, as noções falsas de língua e gramática, a obsessão gramaticalista, a inutilidade do ensino da teoria gramatical, a visão distorcida de que se ensinar a língua é se ensinar a escrever certo, o esquecimento a que se relega a prática lingüística, a postura prescritiva, purista e alienada - tão comum nas "aulas de português".

O velho pesquisador apaixonado pelos problemas de língua, teórico de espírito lúcido e de larga formação lingüística e professor de longa experiência leva o leitor a discernir com rigor gramática e comunicação: gramática natural e gramática artificial; gramática tradicional e lingüística;o relativismo e o absolutismo gramatical; o saber dos falantes e o saber dos gramáticos, dos lingüistas, dos professores; o ensino útil, do ensino inútil; o essencial, do irrelevante".






Pode-se também resumir de acordo com a ordem dos fatos, das partes e dos capítulos.

Veja o exemplo da resenha "Receitas para manter o coração em forma" (Zero Hora, 26 de agosto, 1996), sobre o livro "Cozinha do Coração Saudável", produzido pela LDA Editora, com o apoio da Beal.



Receitas para manter o coração em forma


"Na apresentação, textos curtos definem os diferentes tipos de gordura e suas formas de atuação no organismo. Na introdução os médicos explicam numa linguagem perfeitamente compreensível o que é preciso fazer (e evitar) para manter o coração saudável.

As receitas de Cozinha do Coração Saudável vêm distribuídas em desjejum e lanches, entradas, saladas e sopas; pratos principais; acompanhamentos; molhos e sobremesas. Bolinhos de aveia e passas, empadinhas de queijo, torta de ricota, suflê de queijo, salpicão de frango, sopa fria de cenoura e laranja, risoto com açafrão, bolo de batata, alcatra ao molho frio, purê de mandioquinha, torta fria de frango, crepe de laranja e pêras ao vinho tinto são algumas das iguarias".








10. Como se inicia uma resenha

       Pode-se começar uma resenha citando-se imediatamente a obra a ser resenhada. Veja os exemplos:

"Língua e liberdade: por uma nova concepção da língua materna e seu ensino" (L&PM, 1995, 112 páginas), do gramático Celso Pedro Luft, traz um conjunto de idéias que subvertem a ordem estabelecida no ensino da língua materna, por combater, veementemente, o ensino da gramática em sala de aula.


Mais um exemplo:
"Michael Jackson: uma Bibliografia Não Autorizada (Record: tradução de Alves Calado; 540 páginas, 29,90 reais), que chega às livrarias nesta semana, é o melhor perfil de astro mais popular do mundo". (Veja, 4 de outubro, 1995).


      Outra maneira bastante freqüente de iniciar uma resenha é escrever um ou dois parágrafos relacionados com o conteúdo da obra.
      Observe o exemplo da resenha sobre o livro "História dos Jovens" (Giovanni Levi e Jean-Claude Schmitt), escrita por Hilário Franco Júnior (Folha de São Paulo, 12 de julho, 1996).



O que é ser jovem


Hilário Franco Júnior

Há poucas semanas, gerou polêmica a decisão do Supremo Tribunal Federal que inocentava um acusado de manter relações sexuais com uma menor de 12 anos. A argumentação do magistrado, apoiada por parte da opinião pública, foi que "hoje em dia não há menina de 12 anos, mas mulher de 12 anos".

Outra parcela da sociedade, por sua vez, considerou tal veredito como a aceitação de "novidades imorais de nossa época". Alguns dias depois, as opiniões foram novamente divididas diante da estatística publicada pela Organização Mundial do Trabalho, segundo a qual 73 milhões de menores entre 10 e 14 anos de idade trabalham em todo o mundo. Para alguns isso é uma violência, para outros um fato normal em certos quadros sócio-econômico-culturais.

Essas e outras discussões muito atuais sobre a população jovem só podem pretender orientar comportamentos e transformar a legislação se contextualizadas, relativizadas. Enfim, se historicizadas. E para isso a "História dos Jovens" - organizada por dois importantes historiadores, o modernista italiano Giovanno Levi, da Universidade de Veneza, e o medievalista francês Jean-Claude Schmitt, da École des Hautes Études em Sciences Sociales - traz elementos interessantes.

              Observe igualmente o exemplo a seguir - resenha sobre o livro "Cozinha do Coração Saudável", LDA Editores, 144 páginas (Zero Hora, 23 de agosto, 1996).



Receitas para manter o coração em forma

Entre os que se preocupam com o controle de peso e buscam uma alimentação saudável são poucos os que ainda associam estes ideais a uma vida de privações e a uma dieta insossa. Os adeptos da alimentação de baixos teores já sabem que substituições de ingredientes tradicionais por similares light garantem o corte de calorias, açúcar e gordura com a preservação (em muitos casos total) do sabor. Comprar tudo pronto no supermercado ou em lojas especializadas é barbada. A coisa complica na hora de ir para a cozinha e acertar o ponto de uma massa de panqueca,crepe ou bolo sem usar ovo. Ou fazer uma polentinha crocante, bolinhos de arroz e croquetes sem apelar para a frigideira cheia de óleo. O livro Cozinha do Coração Saudável apresenta 110 saborosas soluções para esses problemas. Produzido pela LDA Editora com apoio da Becel, Cozinha do Coração saudável traz receitas compiladas por Solange Patrício e Marco Rossi, sob orientação e supervisão dos cardiologistas Tânia Martinez, pesquisadora e professora da Escola Paulista de Medicina, e José Ernesto dos Santos, presidente do departamento de Aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia e professor da faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Os pratos foram testados por nutricionistas da Cozinha Experimental Van Den Bergh Alimentos.


Há, evidentemente, numerosas outras maneiras de se iniciar um texto-resenha. A leitura (inteligente) desse tipo de texto poderá aumentar o leque de opções para iniciar uma recensão crítica de maneira criativa e cativante, que leva o leitor a interessar-se pela leitura.

11. A crítica

A resenha crítica não deve ser vista ou elaborada mediante um resumo a que se acrescenta, ao final, uma avaliação ou crítica. A postura crítica deve estr presente desde a primeira linha, resultando num texto em que o resumo e a voz crítica do resenhista se interpenetram.

O tom da crítica poderá ser moderado, respeitoso, agressivo, etc.

Deve ser lembrado que os resenhistas - como os críticos em geral - também se tornam objetos de críticas por parte dos "criticados" (diretores de cinema, escritores, etc.), que revidam os ataques qualificando os "detratores da obra" de "ignorantes" (não compreenderam a obra) e de "impulsionados pela má-fé".

TIRADO DO GUIA DE PRODUAO TEXTUAL DA PUC
                   Como Escrever um Fluxo de Consciência



1. Introdução

Escrever em / um fluxo de consciência é como instalar uma câmera na cabeça da personagem, retratando fielmente sua imaginação, seus pensamentos. Como o pensamento, a consciência não é ordenada, o texto-fluxo-de-consciência também não o é. Presente e passado, realidade e desejos, anseios e reminiscências, falas e ações se misturam na narrativa num jorro desarticulado, descontínuo, numa sintaxe caótica, apresentando as reações íntimas da personagem fluindo diretamente da consciência, livres e espontâneas.

É como se o autor "largasse" a personagem, deixando-a entregue a si mesma, às suas divagações, resultando um texto que lembra a associação livre de idéias, de feitio incoerente, desconexo, sem os nexos ou enlaces sintáticos de um texto "bem comportado".

É como se fosse um depoimento, a expressão livre, desenfreada, desinibida, ininterrupta, difusa, alógica de pensamentos e emoções, muitas vezes de uma mente conturbada e atônita.

No fluxo de consciência o pensamento simplesmente flui, pois a personagem não pensa de maneira ordenada, coerente, razão por que o texto se apresenta sem parágrafos, sem pontos, ininterrupto; numa palavra, caótica.

Na literatura universal, os grandes mestres desta técnica são James Joyce ("Ulysses"), Virgínia Woolf ("Mrs. Dalloway" (filme: As Horas)) e William Faulkner ("O Som e a Fúria"; "As Lay Dying").

Em nosso meio, entre tantos escritores, poderiam ser citados Antônio Callado ("Assunção de Salviano'), Autran Dourado ("A Barca dos Homens") e Clarice Lispector ("Perto do Coração Selvagem"; "A Hora da Estrela").
                   Como Estruturar um Texto Argumentativo




1. O texto argumentativo

COMUNICAR não significa apenas enviar uma mensagem e fazer com que nosso ouvinte/leitor a receba e a compreenda. Dito de uma forma melhor, podemos dizer que nós nos valemos da linguagem não apenas para transmitir idéias, informações. São muito freqüentes as vezes em que tomamos a palavra para fazer com que nosso ouvinte/leitor aceite o que estamos expressando (e não apenas compreenda); que creia ou faça o que está sendo dito ou proposto.

Comunicar não é, pois, apenas um fazer saber, mas também um fazer crer, um fazer fazer. Nesse sentido, a língua não é apenas um instrumento de comunicação; ela é também um instrumento de ação sobre os espíritos, isto é, uma estratégia que visa a convencer, a persuadir, a aceitar, a fazer crer, a mudar de opinião, a levar a uma determinada ação.

Assim sendo, talvez não se caracterizaria em exagero afirmarmos que falar e escrever é argumentar.

TEXTO ARGUMENTATIVO é o texto em que defendemos uma idéia, opinião ou ponto de vista, uma tese, procurando (por todos os meios) fazer com que nosso ouvinte/leitor aceite-a, creia nela.

Num texto argumentativo, distinguem-se três componentes: a tese, os argumentos e as estratégias argumentativas.

TESE, ou proposição, é a idéia que defendemos, necessariamente polêmica, pois a argumentação implica divergência de opinião.

A palavra ARGUMENTO tem uma origem curiosa: vem do latim ARGUMENTUM, que tem o tema ARGU , cujo sentido primeiro é "fazer brilhar", "iluminar", a mesma raiz de "argênteo", "argúcia", "arguto".

Os argumentos de um texto são facilmente localizados: identificada a tese, faz-se a pergunta por quê? (Ex.: o autor é contra a pena de morte (tese). Porque ... (argumentos).

As ESTRATÉGIAS não se confundem com os ARGUMENTOS. Esses, como se disse, respondem à pergunta por quê (o autor defende uma tese tal PORQUE ... - e aí vêm os argumentos).

ESTRATÉGIAS argumentativas são todos os recursos (verbais e não-verbais) utilizados para envolver o leitor/ouvinte, para impressioná-lo, para convencê-lo melhor, para persuadi-lo mais facilmente, para gerar credibilidade, etc.

Os exemplos a seguir poderão dar melhor idéia acerca do que estamos falando.

A CLAREZA do texto - para citar um primeiro exemplo - é uma estratégia argumentativa na medida em que, em sendo claro, o leitor/ouvinte poderá entender, e entendo, poderá concordar com o que está sendo exposto. Portanto, para conquistar o leitor/ouvinte, quem fala ou escreve vai procurar por todos os meios ser claro, isto é, utilizar-se da ESTRATÉGIA da clareza. A CLAREZA não é, pois, um argumento, mas é um meio (estratégia) imprescindível, para obter adesão das mentes, dos espíritos.

O emprego da LINGUAGEM CULTA FORMAL deve ser visto como algo muito es-tra-té-gi-co em muitos tipos de texto. Com tal emprego, afirmamos nossa autoridade (= "Eu sei escrever. Eu domino a língua! Eu sou culto!") e com isso reforçamos, damos maior credibilidade ao nosso texto. Imagine, estão, um advogado escrevendo mal ... ("Ele não sabe nem escrever! Seus conhecimentos jurídicos também devem ser precários!").

Em outros contextos, o emprego da LINGUAGEM FORMAL e até mesmo POPULAR poderá ser estratégico, pois, com isso, consegue-se mais facilmente atingir o ouvinte/leitor de classes menos favorecidas.

O TÍTULO ou o INÍCIO do texto (escrito/falado) devem ser utilizados como estratégias ... como estratégia para captar a atenção do ouvinte/leitor imediatamente. De nada valem nossos argumentos se não são ouvidos/lidos.

A utilização de vários argumentos, sua disposição ao longo do texto, o ataque às fontes adversárias, as antecipações ou prolepses (quando o escritor/orador prevê a argumentação do adversário e responde-a), a qualificação das fontes, a utilização da ironia, da linguagem agressiva, da repetição, das perguntas retóricas, das exclamações, etc. são alguns outros exemplos de estratégias.



2. A estrutura de um texto argumentativo


2.1 A argumentação formal

A nomenclatura é de Othon Garcia, em sua obra "Comunicação em Prosa Moderna".

O autor, na mencionada obra, apresenta o seguinte plano-padrão para o que chama de argumentação formal:

Proposição (tese): afirmativa suficientemente definida e limitada; não deve conter em si mesma nenhum argumento.
Análise da proposição ou tese: definição do sentido da proposição ou de alguns de seus termos, a fim de evitar mal-entendidos.
Formulação de argumentos: fatos, exemplos, dados estatísticos, testemunhos, etc.
Conclusão.

Observe o texto a seguir, que contém os elementos referidos do plano-padrão da argumentação formal.



Gramática e desempenho Lingüístico


Pretende-se demonstrar no presente artigo que o estudo intencional da gramática não traz benefícios significativos para o desempenho lingüístico dos utentes de uma língua.


Por "estudo intencional da gramática" entende-se o estudo de definições, classificações e nomenclatura; a realização de análises (fonológica, morfológica, sintática); a memorização de regras (de concordância, regência e colocação) - para citar algumas áreas. O "desempenho lingüístico", por outro lado, é expressão técnica definida como sendo o processo de atualização da competência na produção e interpretação de enunciados; dito de maneira mais simples, é o que se fala, é o que se escreve em condições reais de comunicação.


A polêmica pró-gramática x contra gramática é bem antiga; na verdade, surgiu com os gregos, quando surgiram as primeiras gramáticas. Definida como "arte", "arte de escrever", percebe-se que subjaz à definição a idéia da sua importância para a prática da língua. São da mesma época também as primeiras críticas, como se pode ler em Apolônio de Rodes, poeta Alexandrino do séc.II ª C.:


"Raça de gramáticos, roedores que ratais na musa de outrem, estúpidas lagartas que sujais as grandes obras, ó flagelo dos poetas que mergulhais o espírito das crianças na escuridão, ide para o diabo, percevejos que devorais os versos belos".


Na atualidade, é grande o número de educadores, filólogos e lingüistas de reconhecido saber que negam a relação entre o estudo intencional da gramática e a melhora do desempenho lingüístico do usuário. Entre esses especialistas, deve-se mencionar o nome do Prof. Celso Pedro Luft com sus obra "Língua e liberdade: por uma nova concepção de língua materna e seu ensino" (L&PM, 1995). Com efeito, o velho pesquisar apaixonado pelos problemas da língua, teórico de espírito lúcido e de larga formação lingüística, reúne numa mesma obra convincente fundamentação para seu combate veemente contra o ensino da gramática em sala de aula. Por oportuno, uma citação apenas:


"Quem sabe, lendo este livro muitos professores talvez abandonem a superstição da teoria gramatical, desistindo de querer ensinar a língua por definições, classificações, análises inconsistentes e precárias hauridas em gramáticas. Já seria um grande benefício". (p. 99)


Deixando-se de lado a perspectiva teórica do Mestre, acima referida suponha-se que se deva recuperar lingüisticamente um jovem estudante universitário cujo texto apresente preocupantes problemas de concordância, regência, colocação, ortografia, pontuação, adequação vocabular, coesão, coerência, informatividade, entre outros. E, estimando-lhe melhoras, lhe fosse dada uma gramática que ele passaria a estudar: que é fonética? Que é fonologia? Que é fonemas? Morfema? Qual é coletivo de borboleta? O feminino de cupim? Como se chama quem nasce na Província de Entre-Douro-e-Minho? Que é oração subordinada adverbial concessiva reduzida de gerúndio? E decorasse regras de ortografia, fizesse lista de homônimos, parônimos, de verbos irregulares ... e estudasse o plural de compostos, todas regras de concordância, regências ... os casos de próclise, mesóclise e ênclise. E que, ao cabo de todo esse processo, se voltasse a examinar o desempenho do jovem estudante na produção de um texto. A melhora seria, indubitavelmente, pouco significativa; uma pequena melhora, talvez, na gramática da frase, mas o problema de coesão, de coerência, de informatividade - quem sabe os mais graves - haveriam de continuar. Quanto mais não seja porque a gramática tradicional não dá conta dos mecanismos que presidem à construção do texto.


Poder-se-á objetar que o ilustração de há pouco é apenas hipotética e que, por isso, um argumento de pouco valor. Contra argumentar-se-ia dizendo que situação como essa ocorre de fato na prática. Na verdade, todo o ensino de 1° e 2° graus é gramaticalista, descritivista, definitório, classificatório, nomenclaturista, prescritivista, teórico. O resultado? Aí estão as estatísticas dos vestibulares. Valendo 40 pontos a prova de redação, os escores foram estes no vestibular 1996/1, na PUCRS: nota zero: 10% dos candidatos, nota 01: 30%; nota 02: 40%; nota 03: 15%; nota 04: 5%. Ou seja, apenas 20% dos candidatos escreveram um texto que pode ser considerado bom.


Finalmente pode-se invocar mais um argumento, lembrando que são os gramáticos, os lingüistas - como especialistas das línguas - as pessoas que conhecem mais a fundo a estrutura e o funcionamento dos códigos lingüísticos. Que se esperaria, de fato, se houvesse significativa influência do conhecimento teórico da língua sobre o desempenho? A resposta é óbvia: os gramáticos e os lingüistas seriam sempre os melhores escritores. Como na prática isso realmente não acontece, fica provada uma vez mais a tese que se vem defendendo.


Vale também o raciocínio inverso: se a relação fosse significativa, deveriam os melhores escritores conhecer - teoricamente - a língua em profundidade. Isso, no entanto, não se confirma na realidade: Monteiro Lobato, quando estudante, foi reprovado em língua portuguesa (muito provavelmente por desconhecer teoria gramatical); Machado de Assis, ao folhar uma gramática declarou que nada havia entendido; dificilmente um Luis Fernando Veríssimo saberia o que é um morfema; nem é de se crer que todos os nossos bons escritores seriam aprovados num teste de Português à maneira tradicional (e, no entanto eles são os senhores da língua!).


Portanto, não há como salvar o ensino da língua, como recuperar lingüisticamente os alunos, como promover um melhor desempenho lingüístico mediante o ensino-estudo da teoria gramatical. O caminho é seguramente outro.



Gilberto Scarton







Eis o esquema do texto em seus quatro estágios:


Primeiro estágio: primeiro parágrafo, em que se enuncia claramente a tese a ser defendida.


Segundo estágio: segundo parágrafo, em que se definem as expressões "estudo intencional da gramática" e "desempenho lingüístico", citadas na tese.


Terceiro estágio: terceiro, quarto, quinto, sexto, sétimo e oitavo parágrafos, em que se apresentam os argumentos.


Terceiro parágrafo: parágrafo introdutório à argumentação.
Quarto parágrafo: argumento de autoridade.
Quinto parágrafo: argumento com base em ilustração hipotética.
Sexto parágrafo: argumento com base em dados estatísticos.
Sétimo e oitavo parágrafo: argumento com base em fatos.
Quarto estágio: último parágrafo, em que se apresenta a conclusão.



2.2 A argumentação informal

A nomenclatura também é de Othon Garcia, na obra já referida.

A argumentação informal apresenta os seguintes estágios:

Citação da tese adversária
Argumentos da tese adversária
Introdução da tese a ser defendida
Argumentos da tese a ser defendida
Conclusão
Observe o texto exemplar de Luís Alberto Thompson Flores Lenz, Promotor de Justiça.



Considerações sobre justiça e eqüidade


Hoje, floresce cada vez mais, no mundo jurídico a acadêmico nacional, a idéia de que o julgador, ao apreciar os caos concretos que são apresentados perante os tribunais, deve nortear o seu proceder mais por critérios de justiça e eqüidade e menos por razões de estrita legalidade, no intuito de alcançar, sempre, o escopo da real pacificação dos conflitos submetidos à sua apreciação.


Semelhante entendimento tem sido sistematicamente reiterado, na atualidade, ao ponto de inúmeros magistrados simplesmente desprezarem ou desconsiderarem determinados preceitos de lei, fulminando ditos dilemas legais sob a pecha de injustiça ou inadequação à realidade nacional.


Abstraída qualquer pretensão de crítica ou censura pessoal aos insignes juízes que se filiam a esta corrente, alguns dos quais reconhecidos como dos mais brilhantes do país, não nos furtamos, todavia, de tecer breves considerações sobre os perigos da generalização desse entendimento.


Primeiro, porque o mesmo, além de violar os preceitos dos arts. 126 e 127 do CPC, atenta de forma direta e frontal contra os princípios da legalidade e da separação de poderes, esteio no qual se assenta toda e qualquer idéia de democracia ou limitação de atribuições dos órgãos do Estado.


Isso é o que salientou, e com a costumeira maestria, o insuperável José Alberto dos Reis, o maior processualista português, ao afirmar que: "O magistrado não pode sobrepor os seus próprios juízos de valor aos que estão encarnados na lei. Não o pode fazer quando o caso se acha previsto legalmente, não o pode fazer mesmo quando o caso é omisso".


Aceitar tal aberração seria o mesmo que ferir de morte qualquer espécie de legalidade ou garantia de soberania popular proveniente dos parlamentos, até porque, na lúcida visão desse mesmo processualista, o juiz estaria, nessa situação, se arvorando, de forma absolutamente espúria, na condição de legislador.


A esta altura, adotando tal entendimento, estaria institucionalizada a insegurança social, sendo que não haveria mais qualquer garantia, na medida em que tudo estaria ao sabor dos humores e amores do juiz de plantão.


De nada adiantariam as eleições, eis que os representantes indicados pelo povo não poderiam se valer de sua maior atribuição, ou seja, a prerrogativa de editar as leis.


Desapareceriam também os juízes de conveniência e oportunidade política típicos dessas casas legislativas, na medida em que sempre poderiam ser afastados por uma esfera revisora excepcional.


A própria independência do parlamento sucumbiaria integralmente frente à possibilidade de inobservância e desconsideração de suas deliberações.


Ou seja, nada restaria, de cunho democrático, em nossa civilização.


Já o Poder Judiciário, a quem legitimamente compete fiscalizar a constitucionalidade e legalidade dos atos dos demais poderes do Estado, praticamente aniquilaria as atribuições destes, ditando a eles, a todo momento, como proceder.


Nada mais é preciso dizer para demonstrar o desacerto dessa concepção.


Entretanto, a defesa desse entendimento demonstra, sem sombra de dúvidas, o desconhecimento do próprio conceito de justiça, incorrendo inclusive numa contradictio in adjecto.


Isto porque, e como magistralmente o salientou o insuperável Calamandrei, "a justiça que o juiz administra é, no sistema da legalidade, a justiça em sentido jurídico, isto é, no sentido mais apertado, mas menos incerto, da conformidade com o direito constituído, independentemente da correspondente com a justiça social".


Para encerrar, basta salientar que a eleição dos meios concretos de efetivação da Justiça social compete, fundamentalmente, ao Legislativo e ao Executivo, eis que seus membros são indicados diretamente pelo povo.


Ao Judiciário cabe administrar a justiça da legalidade, adequando o proceder daqueles aos ditames da Constituição e da Legislação.


Luís Alberto Thompson Flores Lenz





Eis o esquema do texto em seus cinco estágios;


Primeiro estágio: primeiro parágrafo, em que se cita a tese adversária.


Segundo estágio: segundo parágrafo, em que se cita um argumento da tese adversária "... fulminando ditos dilemas legais sob a pecha de injustiça ou inadequação à realidade nacional".


Terceiro estágio: terceiro parágrafo, em que se introduz a tese a ser defendida.


Quarto estágio: do quarto ao décimo quinto, em que se apresentam os argumentos.


Quinto estágio:os últimos dois parágrafos, em que se conclui o texto mediante afirmação que salienta o que ficou dito ao longo da argumentação.
                                    Como realizar a intertextualidade



1. Introdução

A competência em leitura e em produção textual não depende apenas do conhecimento do código lingüístico. Para ler e escrever com proficiência é imprescindível conhecer outros textos, estar imerso nas relações intertextuais, pois um texto é produto de outro texto, nasce de/em outros textos.

A essa relação (que pode ser explícita ou implícita) que se estabelece entre textos dá-se o nome de intertextualidade. Ela influencia decisivamente, como estamos afirmando, o processo de compreensão e de produção de textos.

Quem lê deve identificar, reconhecer, entender a remissão a outras obras, textos ou trechos. As obras científicas, os ensaios, as monografias, as dissertações, as teses, por exemplo, remetem explicitamente a autores reconhecidos, que corroboram os pontos de vista defendidos. A compreensão de uma charge de jornal implica o conhecimento das notícias do dia. A leitura de um romance, conto ou crônica aponta para outras obras, muitas vezes de forma implícita.

Nossa compreensão de um texto depende assim de nossas experiências de vida, de nossas vivências, de nosso conhecimento de mundo, de nossas leituras. Quanto mais amplo o cabedal de conhecimentos do leitor maior será sua competência para perceber que o texto dialoga com outros, por meio de referências, alusões ou citações, e mais ampla será sua compreensão.

As referências são muitas vezes facilmente perceptíveis, identificadas pelo leitor. Por exemplo, no anúncio publicitário sobre meias "Os fins justificam as meias", o leitor percebe de imediato a recriação da máxima "Os fins justificam os meios". Há, por outro lado, referências, alusões muito sutis, compartilhadas ou identificadas apenas por alguns leitores, que têm um universo cultural, um conhecimento de mundo muito amplo. O texto a seguir ilustra o que foi dito.



Outras Vidas


Vanessa Mello

Acredita-se que, para viver outras vidas, é necessário morrer primeiro e, depois de algum tempo, voltar. Eu já vivi muitas vidas, e nada disso foi preciso. Morei em outros países, em épocas diferentes e até em séculos passados. Tudo em uma única vida, a minha.
Beber "Cherry Brand" nos bares de Paris era uma das coisas que eu adorava fazer, mas um dia, algo terrível aconteceu e acabou com minha alegria. Me transformei em barata. Todos se afastaram de mim, tinham medo e nojo. Até que conheci uma velha, acho que era vidente, que me falou sobre meu amor, tão perto de mim e eu o desconhecia. Foi na Ilha de Paquetá e eu realmente encontrei o amor. Estava naquele garoto que eu conhecia desde criança.
Casei-me com um homem incorrigível, que amava e odiava ao mesmo tempo. Ele morreu, mas não me deixou e passei pela deliciosa experiência de ter dois maridos. Vivi uma paixão impossível e valsei sem melancolia, sem arrependimento.
Presenciei a ditadura, no ano de 1968 e, apesar de algum tempo, parece que ainda não acabou. Construí o império dos Diários e Emissoras Associados e muito contribuí para a comunicação. Passava os dias na Praça da Alfândega, convivendo com os mais variados tipos, na época de seus Anos Dourados.
Conheci muitos lugares. Viajei de barco durante cem dias e fiquei maravilhado com a natureza, com o litoral brasileira e até com a África que nunca chamou minha atenção. Ainda sinto o cheiro do mar. Outra viagem interessante que fiz me revelou fatos que não conhecia sobre o descobrimento do Brasil.
Integrei o Clube do Picadinho, que diminuía a cada encontro. Sabíamos de quem era a vez, mas nunca desistimos. A emoção e o perigo faziam com que essas fossem as melhores refeições.
Esses são apenas alguns relatos de minha vida. Poderia ficar por horas contando minhas aventuras, descrevendo todas as pessoas que conheci e relembrando os infinitos amores que tive. Talvez em outro encontro. Mas antes de me despedir, quero contar como foi o meu primeiro contato com esse mundo maravilhoso.
Aconteceu quando eu ainda era criança e minha mãe me apresentou à Turma da Mônica e depois ao palhacinho Alegria. Eles se tornaram meus companheiros e, à medida que fui crescendo, ganhei novos amigos.
Tenho um poder espantoso. Através dele, conheci novo sentimentos, senti o gosto de novas comidas e bebidas, sem nem mesmo ter experimentado, vesti-me como as "sinhazinhas" do século passado, senti fome como Fabiano. Essa capacidade mágica que tenho não é exclusividade minha, ela está adequada a minha personalidade, mas todos podem ter, é só querer.
Além de adquir cultura e informação, desenvolvi minha criatividade, tive uma visão mais ampla de certos assuntos. Dou asa a minha imaginação, e permito-me conhecer novos costume, lugares, vidas, mundos, sentimentos.




No segundo parágrafo, a autora faz referência a três livros: "Paris é uma festa" (E. Hemingway), "A moreninha" (J. M. de Macedo) e "Metamorfose" (F. Kafka). No terceiro, a "Dona Flor e seus dois maridos" (J. Amado) e "Valsa para Bruno Stein" (C. Kiefer). No quarto, a "Chateau, o rei do Brasil" (F. Moraes). No quinto, a um livro de Amir Link. Mais adiante, a Maurício Cardoso e finalmente, a "Vidas Secas" (G. Ramos). O texto se refere às experiências de leitura da autora.

Os teóricos costumam identificar tipos de intertextualidade, entre os quais podemos destacar:

a que se liga ao conteúdo, isto é, a que se refere a temas ou assuntos contidos em outros textos, mediante referências explícitas (citações, com identificação da fonte) ou mediante referências implícitas;


a que se associa ao caráter formal, isto é, mediante textos que imitam o estilo, a liguagem de um autor ou obra (imitação de linguagem bíblica, jurídica; imitação da linguagem de João Guimarães Rosa; etc.). Um leitor competente identifica facilmente essas relações, esse diálogo entre textos.
A intertextualidade, como dissemos, também diz respeito à possibilidade de um texto ser criado a partir de outro(s) texto(s).

Quem escreve não escreve no vazio, pois um texto não surge do nada. Nasce de/em outro(s) texto(s). Pode-se dizer que escrever é a habilidade de aproveitar criticamente, criativamente outros materiais interdiscursivos, outros textos. É por isso que quem lê (de forma inteligente, conforme expusemos no capítulo "Como desenvolver a competência textual") está em situaçõa privilegiada para escrever, uma vez que se apropria, mediante a leitura, de idéias e de recursos de expressão.

Para ilustrar o fenômeno da intertextualidade bem como para pôr em destaque sua relevância no momento da produção textual, apresentamos a proposta de trabalho aplicada nas salas de aula da Famecos / PUCRS.

Trata-se de produzir uma crônica a partir de uma notícia de jornal: uma mãe dá à luz um filho, às portas do hospital, e é socorrida por populares, que envolvem a criança na Bandeira do Brasil, pois participavam do desfile de 7 de Setembro.

Para a realização do texto, apresenta-se a crônica de Fernando Sabino, em que o aluno observa, entre outros fatos, o estilo (frases curtas, nominais, repetições, etc.). Apresenta-se também pequeno trecho do poema "Morte e Vida Severina" de João Cabral de Melo Neto.

A tarefa consiste em produzir a crônica apropriando-se do estilo de Fernando Sabino e inserindo adequadamente passagens do poema.



2. Textos

2.1 Textos dos quais os alunos devem se apropriar



Notícia de Jornal


Fernando Sabino

Leio no jornal a notícia de que um homem morreu de fome. Um homem de cor branca, 30 anos presumíveis, pobremente vestido, morreu de fome, sem socorros, em pleno centro da cidade, permanecendo deitado na calçada durante 72 horas, para finalmente morrer de fome.
Morreu de fome. Depois de insistentes pedidos e comentários, uma ambulância do Pronto Socorro e uma radiopatrulha foram ao local, mas regressaram sem prestar auxílio ao homem, que acabou morrendo de fome.
Um homem que morreu de fome. O comissário de plantão (um homem) afirmou que o caso (morrer de fome) era da alçada da Delegacia de Mendicância, especialista em homens que morrem de fome. E o homem morreu de fome.
O corpo do homem que morreu de fome foi recolhido ao Instituto Anatômico sem ser identificado. Nada se sabe dele, senão que morreu de fome.
Um homem morre de fome em plena rua, entre centenas de passantes. Um homem caído na rua. Um bêbado. Um vagabundo. Um mendigo, um anormal, um tarado, um pária, um marginal, um proscrito, um bicho, uma coisa - não é um homem. E os outros homens cumprem seu destino de passantes, que é o de passar. Durante setenta e duas horas todos passam, ao lado do homem que morre de fome, com um olhar de nojo, desdém, inquietação e até mesmo piedade, ou sem olhar nenhum. Passam, e o homem continua morrendo de fome, sozinho, isolado, perdido entre os homens, sem socorro e sem perdão.
Não é da alçada do comissário, nem do hospital, nem da rádiopatrulha, por que haveria de ser daminha alçada? Que é que eu tenho com isso? Deixa o homem morrer de fome.
E o homem morre de fome. De trinta anos presumíveis. Pobremente vestido. Morreu de fome, diz o jornal. Louve-se a insistência dos comerciantes, que jamais morrerão de fome, pedindo providências às autoridades. As autoridades nada mais puderam fazer senão remover o corpo do homem. Deviam deixar que apodrecesse, para escarmento dos outros homens. Nada mais puderam fazer senão esperar que morresse de fome.
E ontem, depois de setenta e duas horas de inanição, tombado em plena rua, no centro mais movimentado da cidade do Rio de Janeiro, Estado da Guanabara, um homem morreu de fome.






Morte e Vida Severina


João Cabral de Melo Neto

De sua formosura
já venho dizer:
é um menino magro,
de muito peso não é,
mas tem o peso de homem,
de obra de ventre de mulher.

De sua formosura
deixai-me que diga:
é uma criança pálida,
é uma criança franzina,
mas tem a marca de homem,
marca de humana oficina.

Sua formosura
deixai-me que cante:
é um menino guenzo
como todos os desses mangues,
mas a máquina de homem
já bate nele, incessante.

Sua formosura
eis aqui descrita:
é uma criança pequena,
enclenque e setemesinha,
mas as mãos que criam coisas
nas suas já adivinha.

De sua formosura
deixai-me que diga:
é belo como o coqueiro
que vence a areia marinha.

De sua formosura
deixai-me que diga:
belo como o avelós
contra o Agreste de cinza.

De sua formosura
deixai-me que diga:
belo como a palmatória
na caatinga sem saliva.

De sua formosura
deixai-me que diga:
é tão belo como um sim
numa sala negativa.

É tão belo como a soca
que o canavial multiplica.
Belo porque é uma porta
abrindo-se me muitas saídas.
Belo como a última onda
que o fim do mar sempre adia.
É tão belo como as ondas
em sua adição infinita.

Belo porque tem do novo
a surpresa e a alegria.
Belo como a coisa nova
na prateleira até então vazia.
Como qualquer coisa nova
inaugurando o seu dia.
Ou como o caderno novo
quando a gente o principia.

E belo porque com o novo
todo o velho contagia.
Belo porque corrompe
com sangue novo a anemia.
Infecciona a miséria
com vida nova e sadia.
Com oásis, o deserto,
com ventos, a calmaria.




2.2 Textos de alunos



Pariu no Corredor do Hospital


Renata Appel

Leio no jornal a notícia de uma mulher que pariu no corredor do Hospital Fêmina. Jovem, negra, pobre, pariu no corredor do hospital, com poucos socorros, em pleno banco estofado, em meio a enfermeiras, médicos e pacientes. Somente abriu as pernas e deu à luz.
Pariu no corredor do hospital. Gritou por ajuda, clamou por assistência médica. No entanto, o tempo não pôde esperar e acabou parindo em pleno corredor.
Gestante pariu no corredor de hospital. A enfermeira disse que havia falta de quartos. Fêmina apresentava super lotação de parturientes. E a pobre negra somente abriu as pernas e deu à luz.
Eis que de seu ventre surge um menino magro. De muito peso não é, mas tem peso de homem, de obra de ventre de mulher. É uma criança pálida e franzina. Mas tem a marca de homem, marca de humana oficina.
Pariu no corredor do hospital. Entre diversas enfermeiras, médicos e pacientes. Mulher pobre. Sozinha. Miserável. Gestante. Jovem demais. Negra. Baixo nível. Ignorante. Um bicho, uma coisa - não foi tratada como digna parturiente. E pariu no corredor do hospital. E eis que de seu ventre salta uma criança pequena. É tão bela como um sim numa sala negativa.
Não é responsabilidade dos profissionais, nem do hospital, nem das autoridades. O que têm a ver com o fato? Deixa a mulher parir em pleno corredor.
E ela, o que faz? Jovem e destemida dá à luz sobre um banco estofado, sem recursos e com pouco auxílio. E eis que de seu ventre nasce o menino. Somente após o ocorrido, a jovem é amparada. Nos braços, o rebento abençoado infecciona a miséria com vida nova e sadia.




Observe-se como a autora se apropria habilmente de recursos lingüísticos encontrados na crônica de Fernando Sabino:



Crônica de Fernando Sabino

A repetição "morreu de fome"
(18 ocorrências)

Frases nominais: "Um homem caído na rua. Um bêbado. Um vagabundo. Um mendigo, um anormal, um tarado, um pária, um marginal, um proscrito, um bicho, uma coisa - não é um um homem." Texo de Renata Appel

A repetição "pariu no corredor do Hospital"
(7 ocorrências)

Frases nominais: "Mulher pobre. Sozinha. Miserável. Gestante. Jovem demais. Negra. Baixo nível. Ignorante. Um bicho, uma coisa - não foi tratada como digna parturiente."




Observe-se igualmente como a autora insere passagens do poema de João Cabral de Melo Neto:





" Eis que de seu ventre surge um menino negro. De muito peso não é, mas tem peso de homem, e franzina. Mas tem a marca de homem, marca de humana oficina.


É tão bela quanto um sim numa sala negativa


... infecciona a miséria com vida nova e sadia.







É evidente que a repetição de expressões, o uso adequado de frases curtas, nominais, fragmentadas e a referência aos versos do poema "Morte e vida severina" conferem à crônica traços de literariedade.
Como redigir um texto não revelando o objeto



1. Introdução

Esta técnica foi mencionada quando foram apresentadas fórmulas para iniciar textos. Omitir, no início do texto, o objetivo ou idéia (e só revelá-los adiante) é um artifício original que desperta a curiosidade do leitor. O expediente, no entanto, pode se estender a todo o texto, como demonstramos nesta seção.

A par de outros ganhos que podem advir da produção de textos dentro deste modelo, é preciso ter presente que essa tarefa, de cunho lúdico e desafiador, se presta, ao lado de outras aqui apresentadas, a desenvolver ou resgatar o gosto pela escrita.
Foi observado, com freqüência, a satisfação do aluno, a auto-estima aumentada, por ter produzido algo novo, criativo, surpreendente. O aluno sente-se mais confiante, pois se reconhece como um ser criativo, com poderes de linguagem.



2.Textos

2.1 Textos-modelos



Objeto Estranho


Carlos Drummond de Andrade

Um objeto estranho ameaça incorporar-se à elegância masculina, segundo informa o colega Zózimo. Seu aparecimento ocorreu na Itália, e sua presença já se faz sentir em outras capitais européias.
É a maçaranduba.
A primeira singularidade da maçaranduba consiste em que ela absolutamente não participa da sorte das demais peças do equipamento humano a que se junta. É que a maçaranduba fica perto do vestuário, sem se ligar a ele. É ciosa de sua independência, ao contrário dos outros elementos que colaboram na apresentação do homem em público. Estes seguem conosco na condição de servos dóceis, ao passo que ela mantém liberdade de movimentos. E exige de nossa parte atenções especiais, sob pena de abandonar-nos à primeira distração. Concorda em fazer-nos companhia, mas sem o compromisso de aturar-nos o dia inteiro. Dir-se-ia, mesmo, que nós é que a acompanhamos no seu ir e vir pretenciosamente pelas ruas.
A maçaranduba está sempre à mostra, ostensiva e vaidosa. Sua tendência é para assumir a liderança do conjunto e exibir-se em envoluções fantasistas, que exigem certas habilidades do portador. Assim, quando não tem o que fazer (e de ordinário não tem) descreve círculos e volteios que pretendem ser graciosos em sua gratuidade.
A maçaranduba parece ter mau gênio? Parece, não: tem. Já o demonstrou sempre que algum transeunte lhe despertou antipatia ou lhe recordou episódios menos agradáveis. Pois é. A maçaranduba não é de suportar opiniões contrárias às suas. À falta de melhor argumento, na polêmica, ergue-se inopinadamente, avança como um raio e procura alcançar a parte doutrinária alheia nos pontos mais vulneráveis, desde o lombo até os óculos. Sua agressividade impulsiva costuma levá-la à polícia, quando não se recolhe inerte e indiferente a um canto deixando que seu portador pague a nota dos estragos.
A maçaranduba é basicamente feita de madeira, às vezes se beneficia de espécies vegetais não compactas, o que lhe permite estocar recursos ofensivos de grande temibilidade. Ao vê-la se aproximar, tome cuidado, pois sua ira não se satisfaz com simples esquimoses.
A maçaranduba costuma gostar de ornatos, e uma que pertencia a Balzac era cravejada de pedras preciosas...
A impertinência da maçaranduba, para não dizer arrogância, deve-se talvez ao fato de que em outras eras foi símbolo de poder e, sob formas diversas, esteve ligada à realeza e a seu irmão gêmeo, o absolutismo. Em mãos governamentais, era duplamente terrível: pela contundência material e pela espiritual.
Ter sido a maçaranduba elemento de garridice feminina, durante a Idade Média até a Renascença, não lhe adoçou o temperamento. Passando a andar só com os homens, nem por isso dispensa maior cortesia às mulheres e, na hora de zangar-se, é incapaz de distinguir is sexos.
Diga-se em favor da maçaranduba, para que o retrato não fique excessivamente carregado, que algumas espécimes são inclinadas à generosidade, e se comprazem em ajudar pessoas encanecidas ou faltas de visão. Contudo trata-se de exceção.
A maçaranduba tem um irmão soturno, que paradoxalmente só se anima a passear quando começa a chuva, e sob o aguaceiro se diverte disputando lugar. Muitas vezes este irmão gêmeo imita a mania elegante, no ataque ao próximo.
Cuidado com a maçaranduba, amigos pacíficos: trata-se de objeto às vezes voador, identificado.






Chega, Basta e Fora!


Cyro Silveira Martins Fº

Os acontecimento que o Brasil viveu nessa quinta-feira mostram que caminhamos para um terreno perigosamente pantanoso.
As trevas rondam.
A anarquia ressurge dos bueiros com poder e majestática soberba.
A autoridade que deveria se impor parece inerte e o Brasil hesita e titubeia diante da vontade de uma minoria hábil, atuante e turbulenta, que consegue utilizar-se com destreza da mídia - impressa, falada e televisionada - e consegue impor sua vontade à imensa maior parte dos cidadãos contribuintes e votantes.
E, mais, consegue arrastar em sua cantilene de sereia curvilínea os ingênuos e os que ainda têm a consciência em formação.
Poucos gatos, pingados, mas ardorosos e ousados, que não respeitam leis, regulamentos, regras nem lógica, história, tradição ou costumes.
Nós, os brasileiros verdadeiramente patriotas, não podemos assistir placidamente ao Brasil tendo seu leme quebrado, perdendo o rumo, submetido pela força das idéias exóticas, totalmente desvinculadas de nossa realidade de povo manemolente. Idéias que em nada dizem respeito à nossa natureza espontânea, à nossa exuberância criativa de nação multifacetada étnica, cultural e geograficamente.
Esses, que tentam se impor pela força, desprezando a opinião da avassaladora maioria, se opondo à opinião pública manifestada democraticamente, só contribuem para fragilizar o Brasil diante dos outros países. E para transformar o país numa presa fácil para os predadores estrangeiros. Porque tanto Europa como América Latina só esperam um momento de fraqueza nosso para arremeter e tentar nos colocar de joelhos diante de seus ataques.
Mais ainda.
A arrogância desses que se autoconcedem a onisciência de apenas eles, e ninguém mais que eles, saberem o que é bom para o Brasil, esses que se julgam certos ab initio ad infinitum, esses, que sequer se dignam a explicar aos demais o raciocínio anterior a suas atitudes, a arrogância dessa casta, diante da estupefação de milhões de pessoas, prenuncia uma tempestade de efeitos terríveis sobre a vida, o coração e alma de nós, brasileiros e patriotas.
Não é possível que isso seja levado adiante.
Não podemos, nós, que estamos vendo o Brasil ameaçado, permanecer calados.
Há cheiro de 1974 no ar.
Por isso: chega e basta.
Fora Zagalo.




2.2 Texto de aluno



.....................


Fábio Abreu dos Santos

No começo, ela era minha companheira nos momentos mais difíceis. Sempre que eu estava só, magoado com alguma coisa, houvesse brigado com minha esposa, discutido com os colegas do trabalho, me irritado com meus filhos, eu ia à sua procura. Aliás, com o tempo, qualquer motivo era suficiente para que corresse até ela, tal era o prazer que tal encontro me proporcionava. Ela sempre estava lá, de braços abertos, pronta para me receber, sem me fazer perguntas. Conseguia, de forma milagrosa, confortar-me e fazer-me novamente feliz em questão de segundos. Seu brilho me seduzia, sua voz era como música para meus ouvidos. Uma aura emanava em torno dela. Às vezes na sala, às vezes no quarto, com as luzes apagadas, eu era seduzido por ela, de tal forma que respondia, sem dizer não, a todos os seus apelos. Mas hoje, parece que ela já perdeu um pouco daquele brilho, aquela cor que enfeitava sua fronte. Nossa relação amorosa foi, pouco a pouco, se deteriorando. Talvez fosse a idade dela, talvez fosse seu tamanho. Afinal, convenhamos,14 é muito pouco. Resolvi trocá-la por outra, muito mais bonita, maior, um pouco usada, mas nem tanto. Minha família, após descobrir minhas intenções, até deu-me incentivo para realizar a troca. As crianças, agora, não saem da frente dela. Minha mulher é sua fã número um. Sinceramente, não sei como conseguimos viver até hoje sem uma tv de vinte e uma polegadas.
                                             COMO FAZER O MEU ARTIGO

O artigo é um convite à sua participação no congresso. Algumas bancas estão solicitando o artigo ensaio-crítico como apresentação de TCC, justamente para que o aluno possa expor as suas idéias de forma mais autêntica e original. Os artigos quando produzidos em mais de uma seção podem compor uma tese ou uma dissertação de mestrado.

Atualmente, tratados como papers , os artigos também podem ser de publicação para científica em revistas ou periódicos. Caracterizam-se por pequenos estudos que tratam de versões severamente científicas.

São diferentes da monografia, cujas apresentações são realizadas com o mesmo conteúdo mais com a abordagem mais formalizada. Por ter uma estrutura científica parecida com uma monografia, deve apresentar introdução, desenvolvimento e conclusão.

A introdução apresenta o assunto, o objetivo, a justificativa, metodologia empregada. No desenvolvimento, por ser o bojo do trabalho, consiste na explicação e demonstração do que foi abordado. A conclusão pode ocupar metade da folha e expõe resumidamente os resultados do assunto desenvolvido no texto.

O conteúdo do artigo abrange vários aspectos e, em geral, apresenta temas e abordagens atuais, sem a revisão da literatura e de forma muito solta, crítica e reflexiva. O artigo (paper) científico:

-versa sobre um caminho pessoal percorrido, gerado por uma experiência pessoal dando o enfoque contrário do que está sendo estudado.

-busca oferecer soluções passageiras para respostas controvertidas;

-leva a conhecimento geral, a especialização do acadêmico em assuntos, idéias novas e sonda as opiniões dos leitores em periódicos;

-aborda aspectos secundários que serão utilizados em pesquisas futuras.

Estabelecer um esquema para expor o artigo de maneira lógica e sistemática é equivalente a um projeto de monografia, levando em consideração que o artigo pode estar nos campos científico, didático, divulgação etc.

A escrita deve ser clara, objetiva, direta e a linguagem correta, precisa, coerente e simples. Adjetivos supérfluos, rodeios, repetições ou explicações inúteis devem ser evitados pela brevidade a qual compõe o texto, cuja apresentação é excessivamente de forma compacta. Outro detalhe importante é o título que deve corresponder fidedignamente aos parâmetros do texto.

Como TCC, o artigo deve apresentar os seguintes itens de elaboração. Pode ser um pouco mais extensivo e diferente quando substitui-lo:

O artigo científico é um estudo breve sobre um tema que trata de questões de natureza científica. Esse representa o resultado de estudos realizados, dada sua dimensão e conteúdo, tendo abordagens atuais.

I. Título, subtítulos, nomes da seções e capítulos.

II. Credenciais do(s) autor(es).

III. Resumo : Pode ser em língua materna e/ou estrangeira

IV. Introdução

V.Desenvolvimento

VI. Conclusão e comentários

VII. Referências

VIII.Data de produção do texto.

Para formatar um artigo que terá apresentação em congresso é necessário atentar para algumas regras de formatação:

O artigo inscrito deverá ser entregue no original comp le to e uma cópia, impressos e encadernados, em papel de tamanho A4 (21cm x 29,7cm), anexando junto ao original as “Fichas de Autorização“ (obrigatórias), preenchidas em le tra le gível, assinadas pelo(s) autor(es) e pelo Professor Orientador, e uma cópia digitalizada em disquete (3½) ou CD-Rom, obedecendo à seqüência:

• Ser digitado no Word ( . doc), na fonte Times New Roman, tamanho da fonte 12, com espaço 1,5 entre linhas e parágrafos, e espaço duplo entre partes, configuração de margens: superior 3cm, inferior 2cm, esquerda 3cm, direita 2cm, os nomes científicos quando utilizados deverão estar em itálico;

• Apresentar página de rosto:

Obs .: A página de rosto deverá conter somente texto, não colocar referências bibliográficas, imagens, gráficos, tabelas etc.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MARTINS, GA & LINTZ, A. Guia para a elaboração de monografias e trabalhos de conclusão de curso . Editora Atlas, 2000 (exemplar do professor)
Artigo cientifico é um texto sucinto sobre um tema que deve respaldo de uma comunidade cientifica, conseguindo esse status, através de sua publicação em periódicos científicos.

São elementos formais do Artigo Cientifico:

Título
Autores
Instituição a que pertencem os autores
Resumo
Texto
Referência bibliográfica das obras citadas no texto.
Os pontos assinalados acima como forma do Artigo Cientifico necessariamente não precisam ser seguido à risca já que a cientificidade do texto independe de formalidades

Primeiro passo para se escrever um artigo é a delimitação do método com base das metodologias cientificas balizadas. Deve estar centrado em uma estrutura lógica de raciocínio.

Assim como a maioria dos trabalhos monográficos e científicos o artigo nascerá da proposição de objetivos e metas que nortearão a sua confecção.

É essencial que o artigo cientifico tente provar uma hipótese, ela será comprovada ou não com base nos métodos utilizados.

Por fim, no artigo cientifico será feita a conclusão confirmando ou refutando a hipótese do autor.